quarta-feira, 16 de novembro de 2011

EDUCAÇÃO INFANTIL, DIVERSIDADE E COTIDIANO

    A Educação infantil, primeira etapa da educação básica, teve sua legitimidade  reconhecida na Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº 9394, promulgada em 20 de dezembro de 1996.
A integração de educação Infantil, no âmbito da Educação Básica, como direito das crianças de 0 a 6 anos e suas famílias, dever do Estado e da sociedade civil, é fruto de muitas lutas desenvolvidas por educadores e alguns segmentos da sociedade nos últimos anos.
Infelizmente, a preocupação com o bem estar e o desenvolvimento global é algo recente. Philipe Ariès, em sua obra: “A História Social da Criança e da família”(1978), mostra como o conceito de criança tem evoluído através dos séculos e oscilando entre os pólos que ora o consideram um “bibelot” ou “bichinho de estimação” ora num” adulto em miniatura”, passível de encargos e abusos como os da negligência, do trabalho precoce e da exploração  sexual.
Zabalza (1998), brilhantemente ilustra a história da infância dividindo-a em três momentos que identifica como “primeira, segunda e terceira identidades”.
A primeira identidade refere-se à “criança-adulto” onde a infância é negada, o que ocorreu no período entre a idade média e o início da idade moderna.
A criança, desde que era desmamada, era considerada companheira natural do adulto. Aos sete anos recebia sua carteira de identidade jurídica que a reconhecia como “capaz de entender e querer”. Sob este aspecto, a criança poderá ser incriminada penalmente, trabalhar para seu sustento, ser deslocada de sua família e colocada como aprendiz para ser educado.
A família era uma realidade moral e social, mais do que sentimental. O movimento da vida social envolvia adultos e crianças, não dando tempo à ninguém para a solidão e a intimidade.
Neste período, a criança não aparece nem como centro da sociedade nem como centro da família, mas está presente onde quer que haja pessoas se encontrando ou mantendo qualquer tipo de relação. A educação e a instrução eram ministradas por todos: pais, mestres, companheiros de oficina, vizinhos, comerciantes etc.
A idéia de criança-mistério, alimentada pela crença que nela escondia-se uma natureza sagrada, que o homem não podia profanar , e a imagem da criança como “humanidade na lista de espera” fez com que o mundo adulto a jogasse e abandonasse no mundo a fim de “aprender”, sem mediações nem intervenções, fazendo-a viver como um “adulto em miniatura”.
A segunda identidade caracteriza a “criança-filho-adulto” também conhecida como a infância institucionalizada.
No século XVIII, ao surgimento da família moderna, a infância torna-se o epicentro do interesse dos adultos. O controle se torna mais efetivo e, quando sair do controle da família, a  criança entrará no controle das instituições, no entanto, a importância que lhe é dada na família, é fruto de uma nova organização sócio-cultural, muito mais que uma descoberta da criança.
A escola passa a substituir o sistema de aprendiz tradicional e introduz uma função mais específica, dirigida à inculturação e à socialização. À família, cabe o compromisso com a educação afetiva e ético-comportamental.
Nesta perspectiva só é possível ser criança na condição de filho x aluno, numa estrutura de relações de propriedade e poder, sendo negada à infância a possibilidade de situar-se autonomamente, criando-se a criança padronizada, que segue clichês, homogeneizada.
A terceira identidade é atribuída à criança “sujeito-social”, a infância de hoje que conseguiu, finalmente, desembarcar na praia da liberação – emancipação, que despiu a pesada armadura da privatização familiar e do isolamento escolar, obteve-se enfim, o reencontro da infância.
Zabalza, a respeito da criança sujeito social, afirma:
“A etapa histórica que estamos vivendo, fortemente marcada pela “transformação” tecnológica e pela mudança ético-social, cumpre todos os requisitos para tornar efetiva a conquista do último salto na educação da criança, legitimando-a finalmente como figura-social, como sujeito de direitos enquanto sujeito social” (ZABALZA,1998, p.68).
No Brasil, este marco ocorreu com a Constituição Federal de 1988, propondo uma visão de criança como sujeito de direitos. Esses direitos foram regulamentados no Estatuto da criança e do Adolescente (Lei Federal nº 8.969/90), explicitada uma concepção da criança cidadã “que significa entendê-las como sujeitos de direitos, que merecem proteção integral, por que se encontram em condições especiais de desenvolvimento” (MÜLLER, 1997; in CADERNOS PEDAGÓGICOS PREF. MUN. PORTO ALEGRE,p.13)

No entanto, o fato de termos uma legislação específica para a infância, não tem garantido que direitos sejam respeitados. A discriminação racial, a falta de suporte para portadores de necessidades especiais, as questões de gêneros, enfim a garantia ao respeito à diversidade,  ainda é um caminho a ser percorrido.
A educação de crianças dos Zero aos cinco anos,  com foco na diversidade é um desafio que exige muita sensibilidade e conhecimento. Todos os  seres humanos são únicos , e não são apenas as diferenças de cultura, de gênero ou as chamadas necessidades especiais que determinam tal unicidade. No entanto, apesar de esse conceito já fazer parte do senso comum, lidar com a diversidade na escola  e no cotidiano ainda é um tabu para muitos pais e educadores.
Infância, gênero, sexualidade têm suscitado várias inquietações e infinitas perguntas. Trabalhar com as diferenças e com os diferentes traz cotidianamente desafios para pais e professores.
Tradicionalmente a escola tem sido marcada em sua organização por práticas de critérios seletivos, baseados em concepções homogeneizadoras,  que resultam na rotulação de alguns alunos. Percebe-se isso através da abordagem curricular, que não prevê as diferenças culturais, de gênero, de aprendizagem, enfim, a diversa gama de individualidades.
Segundo a apostila produzida pela secretaria de educação especial- (MEC,2007, p.59):
 “ ...o não reconhecimento da diversidade como um recurso existente na escola e o ciclo constituído pela rotulação, discriminação e exclusão do estudante, contribuiu para aprofundar as desigualdades educacionais ao invés de combatê-las. A fim de equiparar as oportunidades para todos, os sistemas educacionais precisam promover uma reforma profunda, cuja característica central deve ser a flexibilização do conteúdo curricular e o modo como o currículo é incorporado à atividade escolar"

Nesta perspectiva, objetivamos com esta ferramenta digital, despertar nos professores e pais o respeito à diversidade, sendo desenvolvida desde a educação infantil, num trabalho diário e contínuo. 


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
ARIÈS, Philippe. História Social da Criança e da Família. Rio de Janeiro:  Zahar,1978.
BRASIL. Lei 9394, de 1996. Dispõe sobre a lei de diretrizes e bases e dá outras providências. Brasília, 1996.
DUCK, Cynthia. Educar na Diversidade: material de formação docente. Brasília: Mec, Seesp, 2007.
MÜLLER, Verônica Regina. A Criança como Sujeito de Direitos. Texto do Seminário Nacional. Maringá (PR): 1998.
PORTO ALEGRE. Prefeitura Municipal. Proposta Pedagógica de Educação Infantil. (Cadernos Pedagógicos 15). 2. ed. Porto Alegre: rev. e ampliada.
PÁTIO, Educação Infantil - revista. ano VI,nº 16- Artes Médicas, março/junho 2008.
ZABALZA, Miguel A. Qualidade em Educação Infantil. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998

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